sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Hoje é Dia de Oxóssi - Hoje é Dia de São Sebastião - Dia 20 de Janeiro - Okê Caboclo!

  
    Muitos são os devotos se SÃO SEBASTIÃO no Brasil. Multidões o aclamam e o veneram no dia 20 de janeiro (dedicado em sua homenagem). Porém, poucos conhecem de fato a sua verdadeira história.

     São Sebastião nasceu em Narvonne, França, no final do século III, e desde muito cedo seus pais se mudaram para Milão, onde ele cresceu e foi educado. Seguindo o exemplo materno, desde criança São Sebastião sempre se mostrou forte e piedoso na fé.

    Atingindo a idade adulta, alistou-se como militar, nas legiões do Imperador Diocleciano, que até então ignorava o fato de Sebastião ser um cristão de coração. A figura imponente, a prudência e a bravura do jovem militar, tanto agradaram ao Imperador, que este o nomeou comandante de sua guarda pessoal. Nessa destacada posição, Sebastião se tornou o grande benfeitor dos cristãos encarcerados em Roma naquele tempo. Visitava com freqüência as pobres vítimas do ódio pagão, e, com palavras de dádiva, consolava e animava os candidatos ao martírio aqui na terra, que receberiam a coroa de glória no céu. 
      
        Enquanto o imperador empreendia a expulsão de todos os cristãos do seu exército, Sebastião foi denunciado por um soldado. Diocleciano sentiu-se traído, e ficou perplexo ao ouvir do próprio Sebastião que era cristão. Tentou, em vão, fazer com que ele renunciasse ao cristianismo, mas Sebastião com firmeza se defendeu, apresentando os motivos que o animava a seguir a fé cristã, e a socorrer os aflitos e perseguidos.

    O Imperador, enraivecido ante os sólidos argumentos daquele cristão autêntico e decidido, deu ordem aos seus soldados para que o matassem a flechadas. Tal ordem foi imediatamente cumprida: num descampado, os soldados despiram-no, o amarraram a um tronco de árvore e atiraram nele uma chuva de flechas. Depois o abandonaram para que sangrasse até a morte. 
       
       À noite, Irene, mulher do mártir Castulo, foi com algumas amigas ao lugar da execução, para tirar o corpo de Sebastião e dar-lhe sepultura. Com assombro, comprovaram que o mesmo ainda estava vivo. Desamarraram-no, e Irene o escondeu em sua casa, cuidando de suas feridas. Passado um tempo, já restabelecido, São Sebastião quis continuar seu processo de evangelização e, em vez de se esconder, com valentia apresentou-se de novo ao imperador, censurando-o pelas injustiças cometidas contra os cristãos, acusados de inimigos do Estado. 
    
     Diocleciano ignorou os pedidos de Sebastião para que deixasse de perseguir os cristãos, e ordenou que ele fosse espancado até a morte, com pauladas e golpes de bolas de chumbo. E, para impedir que o corpo fosse venerado pelos cristãos, jogaram-no no esgoto público de Roma. 
    
     Uma piedosa mulher, Santa Luciana, sepultou-o nas catacumbas. Assim aconteceu no ano de 287. Mais tarde, no ano de 680, suas relíquias foram solenemente transportados para uma basílica construída pelo Imperador Constantino, onde se encontram até hoje. Naquela ocasião, uma terrível peste assolava Roma, vitimando muitas pessoas. Entretanto, tal epidemia simplesmente desapareceu a partir do momento da transladação dos restos mortais desse mártir, que passou a ser venerado como o padroeiro contra a peste, fome e guerra. 
    
    As cidades de Milão, em 1575 e Lisboa, em 1599, acometidas por pestes epidêmicas, se viram livres desses males, após atos públicos suplicando a intercessão deste grande santo. São Sebastião é também muito venerado em todo o Brasil, onde muitas cidades o tem como padroeiro, entre elas, o Rio de Janeiro .

        Fonte de Pesquisa:
         – Encyclopédia Universal Ilustrada Europeo-Americana, pp. 1262 –1265          

         – Encyclopédia e Dicionário Internacional, p. 10486 

Oração a São Sebastião

Glorioso mártir São Sebastião,
soldado de Cristo
e exemplo de cristão,
hoje vimos pedir
a vossa intercessão
junto ao trono do Senhor Jesus,
nosso Salvador,
por Quem destes a vida.
Vós que vivestes a fé
e perseverastes até o fim,
pedi a Jesus por nós
para que sejamos
testemunhas do amor de Deus.
Vós que esperastes com firmeza
nas palavras de Jesus,
pedi-Lhe por nós,
para que aumente
a nossa esperança na ressurreição.
Vós que vivestes a caridade
para com os irmãos,
pedi a Jesus para que aumente
o nosso amor para com todos.
Enfim, glorioso mártir São Sebastião,
protegei-nos contra a peste,
a fome e a guerra;
defendei as nossas plantações
e os nossos rebanhos,
que são dons de Deus para o nosso bem
e para o bem de todos.
E defendei-nos do pecado,
que é o maior
de todos os males.
Assim seja.


São Sebastião na Umbanda é Oxóssi

    Na Umbanda, Oxóssi é um dos principais Orixás, responsável por uma Linha que abrange caboclos e caboclas no sentido estrito (índios que usam cocares) relacionadas a conselhos sobre cura física ou espiritual. Às vezes é personificado na figura do Caboclo, isto é, do índio, ostentando um cocar e portando arco e flecha. Sua cor é o verde.

        Oxóssi ou Odé manifesta-se, no plano físico, através da fauna e flora do planeta. É o pulmão do universo. Além de exercer domínio sobre todos os elementos da floresta, manipula os valores medicinais e mágicos das plantas, das quais se utiliza para efetuar limpeza vibratória, material e espiritual, dos que dele se socorrem. Domina a força vital cósmica existente na seiva das plantas, aproveitando-se de suas emanações fluídicas para banhos e defumações destinados a descarregar as energias nocivas e equilibrar as forças energéticas do homem. 
     
     Oxossi é o orixá masculino iorubá responsável pela fundamental atividade da caça. Por isso, na África é também cultuado como Odé, que significa caçador. É tradicionalmente associado à Lua e, por conseguinte, à noite, melhor momento para a caça. 
     
     Comparece no plano emocional dos humanos com acentuada característica de afetividade, cooperação, companheirismo, certo grau de aventura e franca liberalidade. Seus “filhos de cabeça” dão ótimos artistas, seja qual for o segmento da arte escolhido, em virtude da latente sensibilidade e inteligência. No plano mental, descortinam inventos, sistemas e estilos engenhosos, admiráveis, de quase impossível enquadramento lógico ou sensata previsão de solução ou acabamento do problema, fruto de sua capacidade intuitiva. 
       
       Geralmente, os filhos de Oxóssi asseguram que não existe protetor mais constante. 
       
       Os festejos dedicados a Oxóssi são muito concorridos por diversos motivos entre os quais destacamos o início do ano religioso, a própria comemoração em que há uma natural e contagiante alegria, com o Templo enfeitado onde se destaca a cor verde, o chão do terreiro coberto de folhas, e galhos de árvores presos à parede recendendo um perfume silvestre. Na mesa, vários cestos ou alguidares cheios de frutas diversas - que serão distribuídas generosamente aos participantes e assistentes. 
     
     As entidades que pertencem à sua falange apresentam-se como caboclos e caboclas. Possuem uma manifestação altiva e emitem vibrações fortes e firmes.

       Sincretismo: São Sebastião 
     
      Sua Guia (Fio de Conta): Suas guias são feitas geralmente com contas verdes e brancas, e em alguns casos, dentes de animais. 
     
     Sua Bebida: Vinho tinto, garapas e sumo de ervas em geral. 
     
     Sua Comida: Frutas não cítricas, milho, raízes, feijão fradinho torrado. 
    
    Suas ervas: Alfavaca do campo, jureminha, caiçara, arruda, abre caminho, malva rosa, capeba, peregum, taioba, sabugueiro, jurema, capim limão, acácia, cipó caboclo, goiabeira, erva de passarinho, guaco, guiné, malva do campo, são gonçalinho, Louro, cabelo de milho, eucalipto, manjericão, samambai.

        Velas: Verde, branca 
       
        Símbolo: Arco e flecha 
        
        Data da comemoração: 20 de janeiro 
        
        Dia da Semana: Quinta-feira
        
        Número: 6 
     
     Saudação: Oxóssi ê meu pai!; ou Okê Arô! - de OKÊ (monte) e AROU (título honroso dado aos caçadores). Significa: “Salve o Grande Caçador!” 
         
        Ponto de Força Vibracional: matas.
      
       Oxóssi é a Natureza, especificamente nas matas e no reino animal. É o conhecedor das ervas e o grande curador. É a essência da nossa vida. 
    
       É o Caçador das Almas da Umbanda e como caçador procura arrebanhar Almas desgarradas para futuramente formar um só rebanho. É o Senhor da Doutrina, aquele que atinge o coração e a inteligência das Almas envoltas em suas vibrações.
   
      Em caráter hierático, Oxossi lembra-nos o MÉDICO, DOUTRINADOR E PASTOR DAS ALMAS. Cura chagas, ensinando a substituição do ódio pelo amor, da luta pela trégua, da insubmissão pela submissão às Leis Divinas. 
      
       É o CAÇADOR DAS ALMAS, o orientador, aquela que mostra o caminho a ser seguido pela humanidade. Modificando inteligências e consciências, atuando na mente e no coração. Essa é a função hierática ou kármica de Oxossi.
   
          Estes protetores atuam manipulando as ervas sagradas, liberando as mazelas que se assentam no corpo astral e mesmo as que se assentam no corpo físico, através das doenças. Liberam as energias mentais pesadas e grosseiras, ativando o intelecto de muitos Filhos de Fé. São mestres na Arte da Magia Vegetal, manipulando quantitativa e qualitativamente o prana acumulado nas ervas, quer sejam elas administradas em chás, banhos ou defumações. 
   
     Assim trabalha a Linha de Oxossi, incrementando o bem-estar astral e físico, livrando muitos Filhos de Fé do Desanimo e da Doença. 
   
      Seu filho tem um tipo calmo, amoroso, encantador, preocupado com todos os problemas. Um grande conselheiro pelo seu gênio alegre, muito embora com forte tendência à solidão. Incapaz de negar qualquer ajuda à alguém, sabe, como poucos, organizar o caminho para as soluções complicadas. Com respeito à sua própria organização familiar, é muito apegado as suas coisas e à sua família, à qual dedica atenção total no sentido de provê-la e encaminhá-la. Diante as dificuldades próprias é muito hesitante, mas acaba vencendo, sustentado pelo seu interior alegre e otimista. É carente. Não assume o problemas dos outros, mas fica lado a lado ajudando-os. Ama a Liberdade e a Natureza. O mato, as águas, os bichos , as estrelas, o sol e a lua, são a bússola de sua vida. Não discute a fé. Acredita e é fiel seguidor da religião que escolheu. Não é ciumento e muito menos rancoroso. Quando atacado custa revidar. Quando o faz se torna perigoso. É, neste particular, ladino como os índios. Pisa macio, mas é certeiro. Tem um gosto refinado. Gosta das coisas boas, veste-se bem e cuidadosamente.
     
       O filho de Oxóssi é talvez o mais equilibrado. Para que sua vida melhore, deve despertar aquele gigante que habita sua essência, o que o tornaria mais disposto a encarar as suas próprias dificuldades. 
    
     Oxóssi é o senhor absoluto das florestas, prados e cerrados, matas e campos, onde floresce e reverdece a natureza fecunda, pulmões plenos de terra que tem a virtude de trazer o alimento vital, produto que é da seara: oxigênio puro do ar, além de todos os gases do cosmo.



       Okê Caboclo, Okê Arô Oxóssi!
 

Oremos:
Meu Pai Oxóssi!

Vós que recebestes de Oxalá o domínio das matas, de onde tiramos o oxigênio necessário á manutenção de nossas vidas durante a passagem terrena, inundai os nossos organismos coma vossas energia, para curar de nossos males!

Vós que sois o protetor dos caboclos, dai-lhes a vossa força, para que possam nos transmitir toda a pujança, a coragem necessária para suportarmos as dificuldades a serem superadas!

Dai-nos paz de espírito, a sabedoria para que possamos compreender a perdoar aqueles que procuram nossos Centros, nosso guias, nossos protetores, apenas por simples curiosidade, sem trazerem dentro de si um mínimo da fé.
Dai-nos paciência para suportarmos aqueles que se julgam os únicos com problemas e desejam merecer das entidades todo o tempo e atenção possível, esquecendo-se de outros irmãos mais necessitados!

Dai-nos tranqüilidade para superarmos todas as ingratidões, todas as calúnias!

Dai-nos coragem para transmitir uma palavra de alento e conforto aqueles que sofrem de enfermidades para quais, na matéria, não há cura!

Dai-nos força para repelir aqueles que desejam vinganças e querem a todo custo magoar seus semelhantes!

Assim Seja!

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Quem foi o Caboclo das 7 Encruzilhadas?


                ... E no entardecer :

E no entardecer do dia 21 de setembro de 1761, na Praça do Rossio, no centro de Lisboa, um santo foi queimado na fogueira dos hereges. Gabriel Malagrida entregou a alma a Deus e o corpo aos carrascos. Tinha 72 anos, 30 deles passados de pés descalços peregrinando pelo Norte e Nordeste brasileiros. Ergueu igrejas e mosteiros, protegeu índios e prostitutas, caminhou mais de dez mil quilômetros entre o Pará e a Bahia. Ganhou fama de taumaturgo, milagreiro. Por ordem e trama do primeiro-ministro Marquês de Pombal, Malagrida terminou acusado de blasfêmia e heresia. Ouviu a sentença de morte no alto de uma carroça, com um barrete de palhaço na cabeça, mãos amarradas para trás e batina pintada com figuras demoníacas. Quando Pombal, ao lado do rei d. José, ordenou a execução, o padre beijou as escadas do cadafalso, virou para o povo, jurou inocência e perdoou seus acusadores. Abaixou a cabeça, ajudou ao próprio algoz a colocar a corda em seu pescoço. Na primeira puxada, o laço se rompeu e a multidão gritou assombrada. A tragédia estava adiada por alguns minutos. Homens e mulheres começaram a prece dos agonizantes, mas não terminaram a oração. Foram impedidos pelos quatro mil soldados de prontidão. ‘‘Senhor, nas vossas mãos entrego minha alma’’. Derradeiras palavras. Em poucos segundos, o padre estava enforcado pela Santa Inquisição. O carrasco acendeu a fogueira, onde o corpo queimaria toda a madrugada, velado pelos milhares de fiéis. As cinzas foram jogadas nas águas do rio Tejo. Quando o dia amanheceu, os católicos de Lisboa espalharam uma mesma notícia: o fogo não queimara o coração do mártir. A tragédia de um peregrino Padre Severino ensina aos fiéis da Paraíba os feitos de Malagrida.

Gabriel Malagrida nasceu padre:
Ainda pequeno, na cidade de Menaggio, no Norte da Itália, aprendeu com o pai Giácomo, o dom da caridade. O patriarca era médico de renome, consultado até por príncipes, mas dedicava boa parte do trabalho ao cuidado de doentes pobres que visitava nas distantes montanhas. Gabriel ia junto. Adorava estudar religião e aproveitava as férias para ensinar catecismo aos irmãos e colegas da rua. Sua brincadeira predileta era montar altar no quintal. A mãe, Ângela, chamava o filho de ‘‘o anjo da casa’’. Era morada cheia de religiosidade. Na parte nobre da casa, havia o que os Malagridas apelidaram de o ‘‘quarto do santo‘‘ por conta do teto coberto de pinturas de Nossa Senhora. O sonho do casal era ver os filhos formados padre e rezando missa ali. O projeto deu certo. Dos onze herdeiros, três viraram sacerdotes. Aos 12 anos, o pequeno Gabriel foi estudar no colégio dos padres Somascos, na cidade de Como. Não era um aluno como os outros; tinha hábitos estranhos. Mordia os dedos até sangrar e quando lhe perguntavam a razão daquilo respondia: ‘‘é para a salvação dos infiéis’’. Nascia assim o costume das penitências físicas que o acompanhou até o fim da vida. Em 1713, no seminário, em Gênova, onde se formou jesuíta com 24 anos chegava a fazer jejuns três vezes por semana. Dizia que era para refrear a natureza e guerrear contra as tréguas do corpo. Era comum ele se açoitar publicamente. Uma vez, em Salvador, na Bahia, Malagrida rezava o sermão na Matriz quando lhe apontaram um homem pecador, cheio de vícios e de ‘‘ignóbeis costumes’’. Como não conseguia, com palavras, converter o cidadão, Malagrida, então, bateu-se com o chicote até o sangue espirrar de suas costas. Ao assistir à dolorida cena, o pecador não se conteve: em lágrimas, ajoelhou-se nos pés do padre, implorando com gemidos o perdão de seus crimes.

A Seguir... você vai conhecer um pouco da biográfia do peregrino que construiu abrigos para prostitutas, fez procissões imensas, criou a Ordem do Sagrado Coração de Jesus e denunciou padres e governadores corruptos. Para conhecer vestígios deixados pelo religioso no Brasil, A nossa equipe percorreu parte das trilhas de Malagrida no Piauí, Maranhão, Ceará, Paraíba e Pernambuco. Junto com o ‘‘Aos povos de Itália não cansam meios de chegar à salvação; além-mar, pelo contrário, inúmeras nações jazem ainda nas trevas da idolatria: vamos acudir a essas almas desamparadas’’. Com esses argumentos, Gabriel Malagrida convenceu o Bispo Geral dos Jesuítas a virar missionário nas Américas. Trocava os estudos avançados de teologia e literatura pela catequese dos índios. Saiu de Lisboa e desembarcou em São Luís do Maranhão no final do ano de 1721, mas demorou dois anos até ser mandado para a primeira missão com os índios. Seus superiores preferiam o erudito religioso nas salas de aula dos seminários de jesuítas e achavam que Malagrida não estava preparado para o convívio com os arredios nativos. Depois de muitas súplicas, o padre conseguiu realizar o antigo sonho. Foi missionário indígena entre 1723 e 1729. Percorria as matas a pé, vestido com a batina preta típica dos jesuítas. Não era a melhor maneira de atravessar o interior maranhense. ‘‘Quem quer andar por essas terras tem que se proteger do mato com roupa de couro e andar sempre a cavalo ou num burro’’, ensina José Assunção e Silva, o Zé Doca, boiadeiro na região de Caxias, antiga Aldeias Altas. Nesse lugar, Malagrida passou em 1726 para catequizar os Guanarés, etnia desaparecida do Maranhão. No Século XVIII, esses índios eram numerosos e arredios ao contato com os brancos. Já haviam sofrido com os portugueses quando Malagrida iniciou o trabalho de catequese. Penou até conquistar a confiança dos Guanarés. Chegaram a decidir em assembléia que matariam o padre. Só conseguiu escapar porque na hora da excução, uma índia velha conteve o braço do nativo. ‘‘Suspende’’, gritou a mu-lher. Explicou que da última vez em que um índio matou um padre roupeta-negra, terminou devorado por vermes. Assustados, os Guanarés liberaram o jesuíta. ‘‘Dificilmente se reconhece o tipo humano nos índios moradores desta região. Abrigam-se em cavernas como as feras e alimentam-se unicamente de caça. As vezes travam-se em pelejas e então devoram os vencidos’’, descreveu Mathias Rodrigues, um dos companheiros de apostolado de Malagrida e que escreveu relatos do tempo em que os dois estiveram no Brasil. O manuscrito de Rodrigues está hoje na biblioteca dos padres boulandistas, em Bruxelas, na Bélgica, mas o professor Vitor Leonardi conseguiu cópia microfilmada da preciosidade. ‘‘É o documento mais importante sobre Malagrida’’, resume Vitor que nos próximos meses irá editar livro com a íntegra do texto. Pelas linhas escritas por Mathias Rodrigues, Malagrida ainda considerava os índios bárbaros selvagens, mas não aceitava sua escravidão. Durante os seis anos em que conviveu com tribos do Pará e do Maranhão, o jesuíta defendeu a tese de que as aldeias deveriam ficar longe do contato com os portugueses. Temia pela saúde moral e física dos nativos. Ou seja, combatia a tradição dos colonizadores que pegavam índios para trabalhar na lavoura de cana. 

Em 1729, Malagrida foi retirado da missão indígena e levado para São Luís. 

Primeiro Milagre...
A vida na capital não sossegou o padre. Em São Luís, iniciou nova etapa de sua jornada: a de missionário popular. Ao invés de índios, cuidava agora dos brancos, moradores da periferia. Dava aula de teologia durante a semana e aos sábados partia para os povoados vizinhos de São Luís. Era livro grosso com as rezas cotidianas que, por vezes, servia de travesseiro quando o religioso adormecia no mato. Para se proteger da floresta fechada, usava um cajado, até bem pouco tempo guardado na Itália como relíquia e apelidado de ‘‘o bordão do peregrino’’ ‘‘Malagrida era pregador carismático’’, explica Miguel Martins Filho, 39 anos, padre, professor de literatura e diretor do Instituto Gabriel Malagrida, em João Pessoa. É ali que se formam todos os jesuítas brasileiros. O que Miguel chama de carisma aparece no jeito de Malagrida atrair os ouvintes. Nos dias santos em São Luís juntava os fiéis em frente a igreja e com um estadandarte nas mãos, saíam todos em procissão cantada pelas ruas da cidade. Paravam nas praças e o padre reunia o povo em volta dele. Ali, dava aula de catecismo, representava teatralmente as principais passagens bíblicas e depois interrogava a platéia sobre o assunto. Foi numa dessas pregações interativas em São Luís que Malagrida fez o que os livros tratam como seu primeiro milagre. Falava aos fiéis sobre a importância da reconciliação entre inimigos quando um dos ouvintes contou que cometera injúria mortal contra um de seus parentes. Na frente do antigo desafeto, contou que estava disposto a pedir perdão, mas o homem não quis fazer as pazes. Malagrida, indignado interferiu. ‘‘Meu irmão, não quereis perdoar ao vosso próximo para que o Senhor vos perdoe?’’. Repetiu a pergunta várias vezes, mas como o indivíduo insistia na recusa, Malagrida gritou atordoado: ‘‘Pecador, recusas a escutar o teu Deus que te convida a perdoar, não tardará que prestes conta a teu juiz da tua dureza, e sofrerás então o castigo merecido’’. Pronto, em menos de 24 horas o infeliz morreu com tiro de mão desconhecida. O povo passou a tratar Malagrida como ‘‘o profeta’’. Carregou esta fama para sua grande viagem missionária, iniciada em julho de 1735 do Maranhão até a Bahia. Primeira longa parada: Piracuruca, no norte do Piauí. ‘‘Servia de igreja aí uma vil casa de farinha com quatro paredes mal pintados por cima, cheia de morcegos. Eu mesmo dei a idéia de construir grandiosa igreja. Todos ofereceram suas esmolas’’, conta Malagrida numa carta mandada ao Bisbo do Algarve, em Portugal. Passados 262 anos, o templo de Piracuruca está de pé. Seu padre, José da Silva Ribeiro, 37 anos, vive pedindo esmolas aos moradores da cidade. Para Malagrida, o Brasil parecia uma Babilônia de pecados. Reclamava dos casamentos fora da Igreja, se horrorizava com a luxúria dos padres e se impressionava com o número de prostitutas. Nos oito dias em que passava em cada cidade, o jesuíta pregava contra os amancebados, chegava a praguejá-los. Em fevereiro de 1744, fazia missão no povoado de Várzea Nova, no interior da Paraíba, quando descobriu homem e mulher que viviam juntos há anos sem oficializar a união. Malagrida foi até a casa dos dois. Tentou convencê-los a dar um ‘‘jeito cristão’’ à história. A mulher concordou, mas o homem achou bobagem aquele falatório do padre. Malagrida renovou seus pedidos, fez pregações públicas sobre o caso, até que num dos sermões avisou que se o cidadão não mudasse de idéia se perderia para sempre. Em 24 horas, o homem morreu com uma terrível dor de cabeça. Neste mesmo povoado de Várzea Nova, a fama milagreira de Malagrida resistiu ao tempo. ‘‘Desde menina, ouço os antigos contarem que o padre Malagrida encostou a mão numa criança que morria de febre e ela ficou logo boa’’, diz Maria Salete da Silva, 58 anos, nascida na região. Ali, não há mais as curas providenciais do padre, porém quem adoece é atendido no posto de saúde de nome Gabriel Malagrida. Na frente, há uma enorme estátua de cimento do jesuíta. 

Vigários do Prazer...
Durante suas expedições, Malagrida cruzou com muitos companheiros de batina fora da linha. Alguns chegavam a cobrar para rezar missa, outros conheciam os prazeres da carne. Tinham mulheres e filhos, o que para Malagrida era um escândalo sem precedentes. ‘‘Esbarrei num vigário que tinha três mancebas patentes e vinte filhos’’, denunciava o missionário em carta aos superiores. Se o barbudo Malagrida era exigente com os fiéis e religiosos, pior ainda era sua auto-cobrança. Tamanha austeridade impressionava até os poucos padres corretos das vilas por onde passava. ‘‘Depois de um sono brevíssimo, o santo padre começava a meditação. Recitadas as horas canônicas, dirigia-se ao confessional e daí por volta da hora décima da manhã, subia ao tablado e explicava a doutrina cristã. Permanecia em ação de graças até a primeira hora da tarde e até mais. Voltando a casa comia, ou poucas favas ou um pouco de leite’’, relatava em carta João Brewer, padre de Ibiapaba, cidade onde Malagrida ficou entre 5 e 17 de fevereiro de 1747. O lugar, chama-se hoje Viçosa do Ceará. Lá, no altar da igreja matriz ainda existe uma imagem de Gabriel Malagrida, de quatro palmos de altura. ‘‘Ele está vestido de São Francisco de Assis porque a imagem foi mandada para reforma e o artista adorava os franciscanos’’, explica o monsenhor Francisco das Chagas Martins, pároco da igreja há 50 anos. ‘‘Tudo aqui é antigo. Nossa igreja é a mais velha do Ceará. Foi fundada em 1602’’. 

Madalenas...
O maior tormento de Malagrida eram as ‘‘mulheres da vida’’. Considerava a prostituição um dos problemas mais graves da colônia. ‘‘Naquele tempo, se uma menina perdia a virgindade, caía em desgraça na sociedade e acabava entrando para a prostituição. Malagrida sonhava em fazer alguma coisa por essas mulheres’’, conta Ilário Govoni, jesuíta italiano, morador de Terezina e autor do único livro publicado no Brasil sobre Malagrida. Chama-se O Missionário Popular do Nordeste. O desafio de ‘‘endireitar’’ prostitutas perseguiu Malagrida até 1742, quando conseguiu financiamento para construir o Convento do Sagrado Coração de Jesus em Igarassu, em Pernambuco. Ali, abrigou 40 mulheres da vida, desejosas de conversão. Saíram em romaria de João Pessoa até a cidade pernambucana. ‘‘Este asilo de Madalenas arrependidas tinha âmbito regional. Às que não podiam casar, por causa de impedimentos ou delas próprias ou dos homens com quem viviam, por já serem casados, abriam-se-lhes as portas desta casa, onde ficavam ao abrigo da miséria e de recaídas’’, escreveu o historiador Serafim Leite, no livro a História Eclesiástica no Brasil. ‘‘Hoje só aceitamos donzelas. Todas nós somos donzelas’’, apressa-se em explicar Maria Medeiros de Paula, 48 anos, e atual diretora do Convento. É freira desde os 17 anos, nunca teve namorado e não gosta muito de falar do passado de pecado das fundadoras da instituição. ‘‘Hoje, só entra na Ordem do Coração de Jesus moça virgem’’. A 60 km dali, em João Pessoa, num outro endereço com placa de Malagrida, perder a virgindade é ganhar a vida. Na rua Gabriel Malagrida, no centro da capital paraibana, funciona o baixo meretrício da cidade. ‘‘Esse Malagrida era dos nossos. Nosso santo protetor’’, brinca dona Lucila Martins, 59 anos, dona de um dos bordéis da rua. 

O Triste Fim...
O triste fim do missionário em janeiro de 1754 Gabriel Malagrida embarcou para Lisboa certo de que conseguiria mais recursos para suas obras no Brasil. Enganou-se, embarcou para a morte. Famoso na corte por seu carisma de pregador, Malagrida era o confessor da rainha, o que despertava ciúmes de poderosos emergentes como Sebastião José de Carvalho, o Marquês de Pombal. Quando a rainha morreu, em 1754, Pombal virou primeiro ministro de Dom Jose I e iniciou perseguição sistemática contra Malagrida. Irritou-se profundamente quando, após o terrível terremoto de Lisboa de 1755, o religioso escreveu panfletos associando a tragédia às maldades da corte. Pombal não se conteve. Conseguiu que Malagrida fosse mandado para a cidade de Setúbal. Atentado em 3 de setembro de 1758, o rei D. José sofreu atentado quando voltava de uma farra noturna. Pombal arranjou testemunhas para envolver Malagrida no caso. No dia 9 de janeiro de 1759, Malagrida foi preso por crime de lesa majestade. Ficou numa cadeia imunda, onde usava tinta de paredes para escrever dois textos religiosos: um sobre a vida de Sant’Ana e outro sobre o retorno do Anti-Cristo. Malagrida acreditava que o apocalipse aconteceria em 1999. O incansável Pombal aproveitou para denunciar Malagrida à Inquisição como herege, mas os próprios juízes do Santo Ofício admitiram que não havia razões para condenar o religioso. Pombal, então, destituiu o presidente do Tribunal e nomeou seu próprio irmão, Paulo de Carvalho. A outra questão era a guerra guaranítica, travada no Sul do Brasil. Os jesuítas se aliaram aos índios contra os portugueses que queriam ampliar as fronteiras do país. Isso tudo não culminou apenas na morte da Malagrida. Em 1759, Pombal expulsou os jesuítas dos domínios portugueses. Foi mais longe. Em 1773, conseguiu do Papa Clemente XIV, a extinção da Companhia de Jesus em todo o mundo. A Companhia só voltou a existir em 1814 e os jesuítas só retornaram ao Brasil no final do século XIX.

Essa é a História de Gabriel Malagrida o nosso Saudoso Caboclo das 7 Encruzilhadas.

Saravá Umbanda.

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Simples Charuto de Caboclo

Ligia segurava o charuto do caboclo que estava a cambonar enquanto a entidade em questão participava dos trabalhos em uma roda de descarrego.

Terminada a tarefa o caboclo dirigiu-se em direção a sua cambone e pediu o charuto de volta agradecendo-a por haver segurado o seu instrumento de trabalho, mas Ligia, não se contendo de sadia curiosidade, perguntou a entidade:
— Senhor caboclo?
— Pois não fia?
— O senhor poderia esclarecer-me uma dúvida?
— Pode fazer pergunta fia!
— O que eu gostaria de saber é o seguinte: por que o senhor sempre me agradece a cada vez que eu entrego o charuto que estou segurando de volta para as suas mãos?
— Suncê quer saber fia?
— Se for possível, gostaria sim.
— Fia, antes de caboclo responder, observe a atuação da nossa linha de trabalho nesta próxima roda de descarrego, sim?
— Sim senhor!
Após trabalhar com todas as pessoas que estavam naquela roda de descarrego a entidade estendeu sua destra a fim de que sua cambone segurasse o seu charuto enquanto ele e as demais entidades que participavam dos trabalhos na roda pudessem finalizar o trabalho.
Ao término daquela roda de descarga a entidade, então, tornou junto à Ligia dizendo:
— Entrega o pito de volta para Caboclo fia!
Ligia devolveu o charuto à entidade que, então, disse-lhe:
— Este caboclo agradece por toda sua atenção.
Ligia sorriu meio que ainda sem entender o porquê daquele agradecimento e o caboclo perguntou a ela:
— E então fia? O que suncê observou do nosso trabalho junto à roda de descarrego?
— Bem, eu observei algumas coisas, mas fica difícil de dizer algo, no aspecto geral, sobre o trabalho dos caboclos em uma roda de descarrego por que cada um trabalha de um jeito diferente em cada assistência.
— Isto até que é verdade, mas o que suncê observou de semelhante no trabalho de qualquer mano caboclo lá na roda?
 — A fumaça do charuto! Nenhum dos senhores trabalha sem ela!
— Muito bem observado fia!
A entidade soltava umas baforadas do seu charuto enquanto fitava o semblante de Ligia e, após alguns instantes, perguntou a ela:
— Suncê ainda não entendeu porque que caboclo lhe agradece por segurar o pito dele, não é?
— Não senhor!
— Fia suncê tem o dom para isso e é por esse motivo que caboclo vai dilatar um pouco de sua percepção sensorial.
— Sim senhor!
A entidade estalava os dedos e soltavas algumas baforadas do seu charuto por toda a cabeça de Ligia. O processo durou poucos segundos e quando terminou a entidade solicitou a Ligia que abrisse os olhos.
— Nossa senhor caboclo!
— O que foi fia?
— É que eu fiquei com um pouco de tontura.
— Não se preocupe que já, já ela passa.
— Sim senhor, na verdade ela já está passando.
— Fia este caboclo vai participar de outra roda de descarrego e pede a suncê que continue a observar pra ver se descobre o porquê do nosso agradecimento, sim?
— Sim senhor.
Quando o caboclo terminou de realizar o seu trabalho com o charuto naquela roda ele, então, estendeu o braço para Ligia que, prontamente, segurou o charuto em suas mãos.
Minutos depois de terminada mais uma roda de descarrego a entidade pediu a Ligia:
— Entrega de volta o pito pra Caboclo fia!
Ligia assim o fez e ele novamente agradeceu-a para depois perguntar:
— E agora fia? O que suncê observou do nosso trabalho na roda?
— Nossa senhor caboclo! Parecia que eu estava ficando louca!
— Por que isso fia?
— Parecia que a fumaça do charuto dos senhores funcionava perispiritualmente para os assistidos na roda como se fosse uma espécie de chuveiro que tira todas as sujeiras do corpo físico.
A entidade sorriu com a comparação de Lígia e ela prosseguiu:
— É sério Sr. Caboclo! Quando a roda de descarrego terminou alguma coisa nelas parecia que estava muito mais limpo do que antes: algumas pessoas respiravam melhor, outras estavam como se tivessem retirado um peso do coração, enfim foi muito bonito de se ver.
— Fia antes de ir para a próxima roda de descarrego este caboclo pede que suncê segure o pito dele.
E, estendendo-lhe a destra, o caboclo entregou o charuto a sua cambone solicitando:
— Fia, agora feche os seus olhos e faça uma prece ao Criador pedindo bênçãos por todos aqueles que ainda passarão pelas rodas de descarga na gira de hoje!
— Sim senhor!
Ligia fez a prece com todo o fervor de sua mente e do seu coração e, então, abriu os olhos.
A entidade, assim, disse-lhe:
— Fia este caboclo agradece por suncê ter segurado o pito dele mais uma vez e pede que suncê observe o trabalho de nós em mais uma roda de descarga para ver se agora descobre o porquê dele agradecer a suncê por segurar o pito, tudo bem?
— Sim senhor!
Quando o caboclo terminou de realizar o seu trabalho com o charuto naquela roda ele, então, estendeu o braço e Ligia, prontamente, segurou em suas mãos o charuto da entidade.
O trabalho naquela roda foi finalizado e quando a entidade aproximou-se de Lígia esta estendeu-lhe as mãos na intenção de devolver o charuto para o caboclo, mas este lhe disse:
— Deixe o pito por mais um tempo em suas mãos que na hora certa este caboclo pede de volta a suncê, sim fia?
— Sim senhor!
— Este caboclo agradece por toda sua dedicação fia e pergunta: o que suncê observou nos trabalhos da última roda que caboclo acabou de participar?
— Senhor caboclo eu realmente observei algumas coisas, mas eu peço ao senhor que, se eu houver visto demais, que o senhor fale francamente comigo como sempre o fez.
— Nossa fia Ligia! Mas por que todo este alvoroço?
— Por que se na penúltima roda que o senhor participou eu percebi que a fumaça dos charutos funciona como a água de um chuveiro, nesta última roda parece que eu vi o que funciona como uma espécie de sabão ou sabonete.
A entidade deu um discreto sorriso para sua cambone e esta tornou a dizer-lhe:
— E então Senhor caboclo? Eu vi coisa onde não existia?
— De forma alguma fia! Suncê só viu o que havia para ver!
— Nossa, mas o senhor fala isto de uma maneira tão calma!
— E qual é o espanto nisto fia?
— Por que o desconhecido assusta um pouco e eu não sei nem um pouco do que eu vi.
— Fia, mas é como suncê mesma disse antes: o que tem de assustador em se tomar uma boa ducha?
— Ducha?
— É fia ou, como suncês encarnados mesmo dizem uma boa chuveirada!
— ?????
— Fia conte pra este caboclo o que foi que suncê viu!
— Bem, enquanto o senhor dava umas baforadas em uma pessoa da roda de descarrego milhares de minúsculos seres ficavam a rodear esta assistência em questão sempre na direção da cabeça para os pés. Estas espécies de seres giravam numa velocidade absurdamente alta e direcionada como se estivessem sendo controlados por alguém a distância. Eles apareciam e sumiam como que por encanto quando o senhor terminava o trabalho em uma pessoa participante da roda de descarga e passava para outra. Bom, foi isto que eu vi.
— A fia só está se esquecendo de um detalhe fundamental em tudo que observou da participação deste caboclo na última roda de descarrego!
— Verdade?
— Fia, fale uma coisa pra este caboclo!
— Sim senhor!
— Segundo a sua observação, participar desta última roda de descarrego foi mais fácil ou mais difícil do que a penúltima em que este caboclo participou?
— Ah, é verdade! Bom quem estava na dinâmica do trabalho lá na roda é o senhor, mas para mim que observava dava a nítida impressão que o senhor conseguia realizar o trabalho com muito mais facilidade, tendo em vista que na penúltima roda parecia que o senhor se concentrava muito mais para poder fazer o seu trabalho do que nesta última.
— Não foi impressão sua fia: para este caboclo, trabalhar nesta ultima roda, foi muito mais fácil que na penúltima e você fia teve uma grande parcela de responsabilidade para que caboclo obtivesse esta facilidade.
— Eu?
— Claro fia, não é suncê que é a cambone deste caboclo?
— Sou eu sim senhor, mas não sei dizer qual foi minha contribuição!
— Pense um pouco minha filha! Qual foi a grande diferença entre a penúltima e a última vez que suncê entregou o pito para este caboclo antes dele participar das rodas?
— Na ultima vez, diferentemente da penúltima, eu fiz uma prece ao Criador pedindo bênçãos para todas as assistências que participariam das rodas. Foi isto senhor caboclo? A prece que fiz a Deus?
— Fia toda prece a Tupã é sempre muito válida em nosso trabalho de fazer a caridade, mas suncê pode relembrar para este caboclo o que suncê possuía em mãos quando proferiu a referida prece?
— Meu Deus é verdade! Em minhas mãos estava o charuto do senhor!
— Exatamente fia! E então, suncê descobriu por que caboclo agradece suncê a cada vez que pede o pito dele?
— O senhor me desculpe, mas é que eu ainda não consegui chegar lá!
— Então este caboclo não vai mais fazer mistério fia: Caboclo agradece a suncê por que a cada vez que sunce entrega o pito de volta pra ele, acaba entregando junto boa parte de sua firmeza, de sua vibração, de sua energia.
— Eu???
— Não só suncê, mas cada cambone que trabalha junto a cada mano caboclo que milita em cada terreiro de Umbanda neste mundo de Tupã Nosso Pai.
— Isto é surpreendente!
— Antes da última roda que caboclo participou suncê fez prece sentida a Tupã e entregou o pito pra caboclo trabalhar cheio destas sutilíssimas e importantíssimas vibrações do desejo de caridade ao próximo.
— Sim, mas eu devo ser sincera e dizer que só fiz isto da última vez.
— Este caboclo sabe.
— Mas se das outras vezes que eu segurava o charuto do senhor eu não fazia prece alguma por que o senhor, mesmo assim, me agradecia?
— Independente de suncê fazer preces ou não, a cada vez que suncê entrega o pito para caboclo, suncê passa muito de sua energia para ele.
— Mas e se eu não estiver com energia boa no dia da gira? Eu vou acabar passando o pito para o senhor impregnado com minhas energias não muito positivas, mesmo assim o senhor me agradeceria?
— Já houve alguma gira que suncê entregou o pito pra Caboclo e ele não lhe agradeceu?
— Não senhor!
— Mas já houve giras em que suncê veio trabalhar com uma energia não muito boa, não é verdade?
— Isto é verdade, mas então por que o senhor sempre agradece?
— Fia, na verdade, o que caboclo agradece é a oportunidade de trabalho no bem que suncês dá pra nós. Umbanda é parceria fia!
— Desculpe, mas como é?
— Parceria fia: estar juntos por um objetivo em comum. Quando suncês cambones estão bem, então suncês fazem preces ou não as fazem, mas entregam o pito para nós com as energias boas que suncês estão naquele dia para nós trabalhar em favor do próximo, não é assim?
— É sim senhor!
— Já quando é suncês que não estão bem, daí somos nós que fazemos preces ao Criador, enquanto seguramos o nosso pito, rogando que suncês possam encontrar melhoras para as dificuldades de suncês e ajudar nós a trabalhar em nome da caridade cada vez mais e melhor e daí, somente após esta prece fervorosa, é que nós entregamos o pito de volta pra suncês segurar a fim de que, captando um pouco de nossa energia que deixamos no pito, suncês consigam encontrar um pouco de lenitivo que o merecimento de suncês lhes facultar.
— Meu Deus, mas isto é lindo!
Assim exclamou Ligia com a voz embargada de emoção pungente e sincera.
— Isto é Umbanda fia e Umbanda, como caboclo disse, é parceria: quando suncê não está bem e entrega o pito impregnado de energias não muito positivas para caboclo, ele então, quando pega este pito das suas mãos, agradece a suncê pela oportunidade que suncê está dando a ele de trabalhar junto a Tupã objetivando a sua melhora energética, vibracional.
— Nossa pelo que o senhor me diz a Umbanda é parceria mesmo, hein?
— Com certeza fia e é por isso que cada vez que um mano caboclo pede o pito de volta para seus cambone ele só tem a agradecer a este.
— Mas o ideal, quando o cambone não está bem, é fazer sempre preces, pedir auxílio a alguma entidade e ficar vigilante para sua vibração não cair e, assim, dificultar o trabalho das entidades, não é assim?
— Certamente não é fia!?! Mas este caboclo sabe que a filha põe em prática aqui no terreiro muito do que acabou de perguntar pra caboclo, não é verdade?
— Infelizmente não é sempre, mas graças a Deus acaba sendo a maioria das vezes, mas...
A voz de Lígia mal conseguia sair dos seus lábios tamanha era a emoção de estar aprendendo coisas tão básicas e importantes para o bom andamento de uma gira, mas de uma forma simples e prática. Mesmo percebendo a dificuldade de Lígia em falar, devido à emotividade, o caboclo incentivou-a dizendo:
— Pode falar fia.
E, fazendo um esforço grandioso para não embargar a sua voz com uma honesta emoção, foi que Lígia disse:
— Sabe o que eu acho mais lindo na Umbanda em relação a tudo isto que o senhor acabou de revelar para mim?
— A voz de suncê está embargada não é fia? Embargada de singela emoção por contemplar a prova do que disse Jesus sobre a simplicidade da misericórdia e benevolência das coisas de Deus materializada na religião de Umbanda pela presença de um simples charuto de caboclo, não é verdade fia?
As lágrimas de agradecimento por estar tendo aquela preciosa conversa com o caboclo deslizavam aos borbotões pela face de Ligia e esta emoção tão bonita e sincera a impedia de proferir qualquer resposta em relação à indagação feita pela entidade e ela, assim, só pôde respondê-lo positivamente acenando com a cabeça.
O caboclo então continuou a conversa dizendo:
— Caboclo agradece a Tupã pela parceria entre suncê e este caboclo e respeita cada lágrima de gratidão ao Criador que está deslizando pelo seu rosto, mas deve solicitar licença por um breve instante neste seu processo de agradecimento para pedir a suncê que devolva o pito deste caboclo para que ele possa participar de mais uma roda de descarrego em nome da caridade ao próximo.
As lágrimas continuavam a escorrer pelo rosto de Ligia e ela, assim, só pôde estender as mãos para devolver o charuto sem nada conseguir dizer a entidade.
A entidade pegou o charuto nas mãos, deu as costas para Ligia, andou um passo a frente e ficou parado de costas para sua cambone.
Talvez fosse para substituir um pouco daquelas lágrimas de alegria por um sorriso singelo feito da mesma emoção, talvez não, o fato foi que o caboclo novamente virou-se de frente para Ligia e disse:
— Pensou que caboclo houvesse se esquecido desta vez não é fia Ligia? Mas este caboclo não esquece nunca de agradecer a suncê por haver segurado por mais uma vez o pito dele. Que Tupã abençoe em dobro toda a atenção que suncê dispensa a este caboclo nesta nossa parceria e que seja abençoada também a parceria que Tupã tem com todos nós através da nossa sagrada e amada religião de Umbanda.
Ao que Lígia, já um tanto refeita em suas emoções, respondeu:
— Que assim seja!!!!!

Mensagem de um caboclo canalizada por Pedro Rangel em 27/01/2010

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